Diante dos casos de possível reação à vacina contra o HPV (papilomavírus humano) que tiveram enorme repercussão na mídia, uma dúvida paira na cabeça dos pais: ”Será que preciso MESMO vacinar minhas filhas contra o vírus?”. A resposta é sim, e elas só estarão protegidas se tomarem as duas doses indicadas da vacina. ”Hoje, a Organização Mundial da Saúde (OMS) não admite mais o licenciamento de uma vacina se não houver mais de 20 mil pessoas envolvidas no estudo, que tem de passar por inúmeras fases e testes em animais. Há regras rígidas de produção e na vigilância de eventos adversos”, tranquiliza a médica Isabella Ballalai, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).
O HPV está longe de ser uma doença rara no Brasil. Mais da metade dos jovens brasileiros são infectados pelo vírus. O objetivo da imunização é evitar a infecção pelos quatro tipos mais prevalentes de HPV, dois dos quais (tipos 16 e 18) estão altamente relacionados ao desenvolvimento de câncer de colo do útero. Os outros dois tipos que são combatidos pela vacina (tipos 6 e 11) não são oncogênicos, mas provocam, entre outros sintomas, a formação de verrugas na pele e nas regiões oral (lábios, boca, cordas vocais), anal, genital e na uretra.
Mesmo vacinada, a mulher deve continuar fazendo o exame de papanicolauapós o início da vida sexual, pois ele consegue detectar as lesões precursoras do câncer de colo de útero. Quando as alterações são identificadas e tratadas, é possível prevenir a doença em 100% dos casos.
Embora não haja dúvidas de que vacinar os filhos contra o HPV seja a conduta recomendada para garantir a saúde das crianças, uma comunidade na página do Facebook intitulada ”Sou contra a vacina HPV” tem aproximadamente 3.200 membros. Pais, mães e profissionais de saúde postam diversos relatos explicando o motivo da recusa da vacina, além de reportagens, depoimentos e fotos.
Em entrevista por e-mail ao portal Drauzio Varella, José Alexandre Tavares, engenheiro da indústria aeroespacial da cidade de São José dos Campos, SP, associa a doença da filha de 13 anos à vacina contra o HPV que ela tomou na época que moravam em Dubai, quando a menina tinha dez anos. O pai relata que os sintomas, como dor intensa nas pernas e dificuldade de locomoção, começaram um mês após a terceira dose da vacina. A princípio a menina recebeu o diagnóstico de Síndrome de Dor Complexa Regional (dor e alterações que acometem extremidades e são desproporcionais ao fator desencadeante). Depois de inúmeras idas e vindas aos mais diversos especialistas, chegou-se ao diagnóstico definitivo: esclerose múltipla. Mas a garota também sofre de problemas vasculares sérios que ainda não foram diagnosticados pelos médicos.
Apesar de não ter uma comprovação causal que relacione a vacina à doença da filha, Tavares diz não ter dúvidas a respeito e chegou até a cobrar uma explicação da Gardasil (fabricante responsável pelo medicamento), mas não obteve resposta satisfatória. ”Hoje não existe teste que confirme com certeza absoluta que a vacina foi a grande causadora [da doença], mas evidências como essas são bastante fortes. Concorda?”
Na mesma comunidade, Jaqueline Barbosa também dá sua versão: ”Os sintomas começaram duas horas depois da vacina contra o HPV”. Ela desenvolveu a Síndrome da Dor Complexa Regional no braço. “Chegamos a um ponto em que ela não conseguia mais fazer nada sozinha. Com os exames foram observadas várias lesões vasculares”, lamenta a mãe, que também associa os sintomas à vacina.
Cássio Reis, analista de sistemas de São Paulo, optou por não vacinar a filha de 11 anos. ”Eu e minha esposa achamos melhor que ela não fosse vacinada. Li muita coisa na internet e penso que há meios de prevenção mais eficazes e seguros”, pontua.
Você certamente já ouviu falar que a vacina que protege contra o sarampocausa autismo. O movimento ganhou força principalmente após a publicação de um artigo científico na revista Lancet (um dos mais importantes periódicos sobre saúde do mundo) no ano de 1998, no qual o médico inglês Andrew Wakefield associava o aumento do número de crianças autistas à vacina tríplice viral, que protege contra sarampo, rubéola e caxumba. O artigo foi o suficiente para que pais assustados deixassem de vacinar os filhos. Entretanto, alguns anos depois, descobriu-se que Wakefield, na verdade, recebia pagamentos de advogados em processos por compensação de danos vacinais. A própria revista foi obrigada a se retratar.
Histórias desse tipo, segundo a médica Helena Sato, diretora de imunização da Secretaria Estadual de Saúde, servem para ajudar a disseminar a má fama da vacina que protege contra o HPV. Segundo a especialista, como na primeira fase da campanha foram vacinados quase 100% do público-alvo, as meninas que já teriam predisposição para desenvolver alguma doença — seja de origem reumatológica, neurológica ou de qualquer outra espécie — ficaram doentes independentemente da vacina. Ainda assim, na segunda fase da campanha a adesão foi mais baixa. ”A ideia de que a vacina poderia agilizar o surgimento de doenças, funcionar como gatilho, é falsa. Porque se isso fosse verdade, nós já teríamos identificado um aumento no número de jovens com doenças reumatológicas nessa faixa etária. E não é o que se observa. A esclerose e outras doenças autoimunes têm a incidência esperada na população em geral”, esclarece Sato.
Em relação aos eventos adversos, como acontece com toda vacina e qualquer medicamento, eles podem ocorrer, mas são considerados leves e de boa conclusão. Dor, edema, dor de cabeça (cefaleia), febre e desmaios são as manifestações mais comuns, nada que dê base para uma decisão de não vacinar os filhos.
Segundo o Ministério da Saúde, no Brasil, após a primeira dose da vacina contra o HPV foram notificados 854 eventos (0,02%) de um total de 4.159.335 doses. Desses, 811 (95%) foram considerados esperados e sem gravidade. Entre os eventos tidos como graves, os mais representativos foram 19 casos de anafilaxia (reação alérgica a algum componente da vacina) e 17 de convulsão(45% e 40% dos casos graves, respectivamente). Esses eventos estão em investigação e, com exceção dos casos de anafilaxia, ainda não existem evidências de associação causal entre eles e a vacina. Os dados comprovam que a vacina do HPV é segura. Todos devem vacinar os filhos contra o HPV.
Fonte: Portal Drauzio Varella